segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Cabra-cega



Tenho me perguntado muitas coisas. Muitas delas que não posso responder e isso vem me tirando a fome, me acordando no meio da noite, me afetando de tal maneira que qualquer brecha de sol me faz desejar uma sombra ao pé da árvore. Em algum ponto da minha vida eu achei que com o chicote certo na mão e esporas devidamente afiadas eu poderia ser a dona do meu mundo. A amazona que rege seu próprio caminho. Mas agora eu corro sem querer correr e sinto o arreio esmagar minha barriga, chego mesmo a sentir a hemorragia me contaminar por dentro. Mas se o chicote come solto a gente tem que andar não é? E o cabresto na minha cara vira inércia. São nomes que já perderam o sentido, fatos e aborrecimentos que já nem ligo, aniversariantes, datas e telefones que decorei antes mesmo de apagar. E que continuam lá, em algum canto de mim. Já não é qualquer tentativa de reaproximação, ou qualquer primeiro contato. São apenas espinhos do que um dia foi meu roseiral. Em certas noites de lua cheia, quando o céu veste sua túnica preta e desaparecem as estrelas e seus pedidos eu perambulo nua. De pés descalços eu sigo pelos mesmos caminhos, me perco nos mesmos atalhos, chego a cair nos mesmos buracos. Nesses dias de escura imensidão eu sou sonâmbula de mim e meu corpo avança por esse quarto movido por lembranças, cheiros, memória vaga. Talvez seja o cansaço. Talvez eu seja a cabra-cega da minha vida. Talvez eu cai no chão e pedi água. Talvez eu só esteja crescendo. Antes tudo fosse como era antes. Antes tudo fosse a sala de espera do dentista. Chegava-se na hora certa e se houvesse atraso não seria problema, sentaria-se num sofá confortável com a televisão ligada na globo, beberia-se um copo de água daqueles de galão com gosto de plástico e fingiria-se despreocupado. De certo aquele barulhinho da mini-broca matava-me por dentro, mas eu agüentaria firme. Eu suportaria firme e calada porque eu sabia que dentro de meia hora qualquer dor que incomodava seria rapidamente extraída de mim. E eu suportaria um tiro no pé. Uma agulha enfiada debaixo da minha unha. Eu suportaria qualquer coisa que arrancasse aquela dor de mim. Dor que a aspirina tinha escondido, mas que na noite passada latejou e me pegou desprevenida. Mas não estou no dentista e nem na sala de espera. Eu estou dentro de mim procurando aquilo que não posso enxergar. Aquilo que sem alvará se apossou de um pedaço de mim. Aquilo que sem eu perceber ás vezes me leva. E eu não sei até onde posso ir, eu não sei onde pisar porque só agora eu percebi o quão é tudo muito escorregadio dentro de mim.

Desconheço a autoria.

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