quarta-feira, 24 de junho de 2009

Antes...


Talvez esta seja a carta que você nunca esperasse receber.Talvez seja puro desabafo ou apenas mera constatação, mas a verdade é que minha vida era muito mais simples de viver antes que você aparecesse e me fizesse esse estrago enorme na alma. Antes, eu já não sentia tristeza ou indiferença. Antes, não me importava dias comemorativos ou finais de semana. Antes, estava acostumada a andar atrás e não ao lado. Antes, palavras não ditas, telefonemas não dados, passavam desapercebidos, pois eu já havia me acomodado na sombra das pessoas. Os gostos não compartilhados me deixavam mais à vontade para me satisfazer à minha maneira, sempre sozinha. A flor por anos esperada, me parecia pálida e envelhecida pelos descasos e palavras proferidas de maneira certa nas horas mais incertas, causando mágoas e desilusões. Acho até na verdade, que já havia me habituado a tudo, e não sentia mais.Muitas vezes, é preferível fechar os olhos e o coração, para não deixar entrar mais dor e nem escapar os sonhos contidos por anos de espera, achando que quando a crise econômica melhorasse, que quando os filhos crescessem, que quando mais tempo tivessemos, você perceberia minha desbotada imagem por perto e me sorriria e compensaria minha espera com palavras de gratidão ou reconhecimento ou apenas palavras boas de se ouvir sem ter esmolado tal atitude.Pois é. Aprendemos facilmente a gostar de tudo que é bom e com tamanha agilidade, incorporamos no dia a dia o que nos atrai, nos da prazer, nos enaltece, nos afaga o ego.Com você foi assim. Você veio para me mostrar um mundo o qual eu supunha existir apenas em romances de Machado de Assis, ou músicas de Vinícius. Gentilezas, palavras, apoio, diversão (porque você sabe que a gente se divertia como ninguém), cumplicidade, atenção, desprendimento, alegrias, tristezas, mágoas também, infelizmente você pontiou nessa história, mas ainda assim, mostrou o que eu não posso ter. Antes, o tanto faz andava de mãos dadas comigo, porque cansada de brigar e lutar, me deixei vencer, indo apenas atrás de onde o vento pudesse me levar. Quando se conhece o reverso de uma história, o que poderia ter acontecido e me foi negado, ao acordar a sensação que ficou é que estive doende, em coma profundo, talvez com morte cerebral, por toda a minha existência e agora acordada, as dores que me sobram são ainda piores das anteriores que depois de tantos anos entorpecida, haviam sido incorporadas em mim sem que eu me desse conta delas mais. Antes, eu vivia uma felicidade imaginária na minha cabeça, mas era minha.Ela tava ali. Antes, as demais coisas já não faziam tanta falta em mim. Antes, meu mundo era pequeno e eu me bastava dentro dele, hoje, diante de tanta imensidão e tamanha devastação, não me acho em lugar algum. Antes...
Mas o que eu queria mesmo dizer com tudo que citei aqui, é OBRIGADA.



Vylna Cassoni
24/06/09

O medo do amor.

Medo de amar? Parece absurdo, com tantos outros medos que temos que enfrentar: medo da violência, medo da inadimplência, e a não menos temida solidão, que é o que nos faz buscar relacionamentos. Mas absurdo ou não, o medo de amar se instala entre as nossas vértebras e a gente sabe por quê. O amor, tão nobre, tão denso, tão intenso, acaba. Rasga a gente por dentro, faz um corte profundo que vai do peito até a virilha, o amor se encerra bruscamente porque de repente uma terceira pessoa surgiu ou simplesmente porque não há mais interesse ou atração, sei lá, vá saber o que interrompe um sentimento, é mistério indecifrável. Mas o amor termina, mal-agradecido, termina, e termina só de um lado, nunca se encerra em dois corações ao mesmo tempo, desacelera um antes do outro, e vai um pouco de dor pra cada canto. Dói em quem tomou a iniciativa de romper, porque romper não é fácil, quebrar rotinas é sempre traumático. Além do amor existe a amizade que permanece e a presença com que se acostuma, romper um amor não é bobagem, é fato de grande responsabilidade, é uma ferida que se abre no corpo do outro, no afeto do outro, e em si próprio, ainda que com menos gravidade. E ter o amor rejeitado, nem se fala, é fratura exposta, definhamos em público, encolhemos a alma, quase desejamos uma violência qualquer vinda da rua para esquecermos dessa violência vinda do tempo gasto e vivido, esse assalto em que nos roubaram tudo, o amor e o que vem com ele, confiança e estabilidade. Sem o amor, nada resta, a crença se desfaz, o romantismo perde o sentido, músicas idiotas nos fazem chorar dentro do carro. Passa a dor do amor, vem a trégua, o coração limpo de novo, os olhos novamente secos, a boca vazia. Nada de bom está acontecendo, mas também nada de ruim. Um novo amor? Nem pensar. Medo, respondemos. Que corajosos somos nós, que apesar de um medo tão justificado, amamos outra vez e todas as vezes que o amor nos chama, fingindo um pouco de resistência mas sabendo que para sempre é impossível recusá-lo.

Martha Medeiros

O contrário de amor.

O contrário de bonito é feio, de rico é pobre, de preto é branco, isso se aprende antes de entrar na escola. Se você fizer uma enquete entre as crianças, ouvirá também que o contrário do amor é o ódio. Elas estão erradas. Faça uma enquete entre adultos e descubra a resposta certa: o contrário do amor não é o ódio, é a indiferença.O que seria preferível, que a pessoa que você ama passasse a lhe odiar, ou que lhe fosse totalmente indiferente? Que perdesse o sono imaginando maneiras de fazer você se dar mal ou que dormisse feito um anjo a noite inteira, esquecido por completo da sua existência? O ódio é também uma maneira de se estar com alguém. Já a indiferença não aceita declarações ou reclamações: seu nome não consta mais do cadastro.Para odiar alguém, precisamos reconhecer que esse alguém existe e que nos provoca sensações, por piores que sejam. Para odiar alguém, precisamos de um coração, ainda que frio, e raciocínio, ainda que doente. Para odiar alguém gastamos energia, neurônios e tempo. Odiar nos dá fios brancos no cabelo, rugas pela face e angústia no peito. Para odiar, necessitamos do objeto do ódio, necessitamos dele nem que seja para dedicar-lhe nosso rancor, nossa ira, nossa pouca sabedoria para entendê-lo e pouco humor para aturá-lo. O ódio, se tivesse uma cor, seria vermelho, tal qual a cor do amor.Já para sermos indiferentes a alguém, precisamos do quê? De coisa alguma. A pessoa em questão pode saltar de bung-jump, assistir aula de fraque, ganhar um Oscar ou uma prisão perpétua, estamos nem aí. Não julgamos seus atos, não observamos seus modos, não testemunhamos sua existência. Ela não nos exige olhos, boca, coração, cérebro: nosso corpo ignora sua presença, e muito menos se dá conta de sua ausência. Não temos o número do telefone das pessoas para quem não ligamos. A indiferença, se tivesse uma cor, seria cor da água, cor do ar, cor de nada.Uma criança nunca experimentou essa sensação: ou ela é muito amada, ou criticada pelo que apronta. Uma criança está sempre em uma das pontas da gangorra, adoração ou queixas, mas nunca é ignorada. Só bem mais tarde, quando necessitar de uma atenção que não seja materna ou paterna, é que descobrirá que o amor e o ódio habitam o mesmo universo, enquanto que a indiferença é um exílio no deserto.

Martha Medeiros
Sumi porque só faço besteira em sua presença, fico mudoquando deveria verbalizar, digo um absurdo atrás do outro quandomelhor seria silenciar, faço brincadeiras de mau gosto e sofroantes, durante e depois de te encontrar.Sumi porque não há futuro e isso não é o mais difícil delidar, pior é não ter presente e o passado ser mais fluido que o ar.Sumi porque não há o que se possa resgatar, meu sumiço écovarde mas atento, meio fajuto meio autêntico, sumi porquesumir é um jogo de paciência, ausentar-se é risco e sapiência,pareço desinteressado, mas sumi para estar para sempre do seulado, a saudade fará mais por nós dois que nosso amor e suadesajeitada e irrefletida permanência

.Martha Medeiros